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Vender é preciso
por Daniel Nedal

O governo Bush tem tentado avidamente impedir a busca iraniana por armas nucleares, lutando por sanções via Conselho de Segurança, pressionando por inspeções internacionais, etc.; neste jogo viu-se de tudo exceto uma declaração de guerra (mas chegou-se bem perto disso). Quando então, do nada, veio a última Estimativa de Inteligência Nacional (National Intelligence Estimate, ou NIE) sobre o programa nuclear iraniano, que afirma com “alto grau de confiabilidade” que tal programa se encontra suspenso desde 2003. Muitos foram rápidos em apontar para o supostamente óbvio: como o relatório arruinava o caso norte-americano contra o Irã. No entanto, elaborado com outro propósito, o NIE de novembro de 2007 (divulgado em dezembro) NÃO É um ataque definitivo à política de Bush vis-à-vis o Irã; pode funcionar tanto contra quanto a favor desta. Depende apenas da habilidade do governo em “vender” sua interpretação do relatório.
Em primeiro lugar, olhemos por um segundo para o histórico dos NIEs e ponderemos sobre quão confiáveis estes são, e portanto quanto peso devemos dar ao relatório sobre o Irã. Podemos identificar alguns NIEs com algumas das mais graves falhas de percepção e subseqüentes erros de condução de política externa durante a Guerra Fria e além. Avaliações de inteligência equivocadas levaram nos Estados Unidos à percepção de um “bomber gap” favorecendo a URSS no final dos anos 50 e de um “missile gap” nos anos 60, que ajudaram a reaquecer as tensões entre as superpotências. NIEs confirmavam as bravatas de Khrushchev sobre a iminência da vitória soviética nas corridas econômica e armamentista, enquanto a economia soviética já começava a apresentar sinais de desgaste. NIEs posteriores vieram a desmenti-los, mas apenas quando a realidade já se tornara suficientemente clara para qualquer observador. Mais recentemente, NIEs foram divulgados apoiando e depois invalidando acusações sobre armas de destruição em massa iraquianas, ligações da Al Qaeda com Saddam Hussein e, é claro, o programa nuclear iraniano. Isto posto, o melhor a ser dito de tais estimativas de inteligência é que estão certas 50% das vezes. O pior a ser dito é que são tão enviesadas quanto qualquer outro documento oficial, servindo um objetivo político determinado; são tanto causa da política quanto uma conseqüência desta, se não menos.
O NIE em questão não poderia ser diferente. Não deve ser considerado um fator capaz de causar alteração em diretivas de política externa, mas um resultado de mudanças já ocorridas, que tornaram possível - e necessário - para o governo americano aliviar a pressão sobre o Irã. Algumas das mais importantes são: o agravamento da crise financeira nos EUA e agora iminente recessão; o relativo avanço no Iraque (que pode, segundo alguns analistas, ser relacionada com menor grau de interferência iraniana); a alta na cotação do barril do petróleo; tensões nas relações russo-americanas; e a crise política no Paquistão. Se uma intervenção (multilateral ou não) no Paquistão deve ser considerada, ainda que como último recurso, os EUA devem conquistar um mínimo de tranqüilidade em relação ao Irã. As eleições presidenciais também deveriam ser contabilizadas, mas não da mesma forma que os exemplos acima, uma vez que não apresentam um incentivo claro e direto relativo à questão iraniana. Todos os elementos acima mencionados tornam extremamente difícil para os EUA continuarem a pressão sobre o Irã. Por este motivo apenas, o NIE, ao minimizar o alarmismo e o senso urgência presentes no discurso de diplomatas e comentadores, pode ser considerado favorável ao governo Bush.

Por outro lado, à medida que o relatório pode ser interpretado como prova de que os EUA têm desperdiçado tempo e energia, é ele próprio um desperdício de papel. As negociações bilaterais estão empacadas há um bom tempo. A atenção só tem favorecido o presidente Ahmadinejad, que soa tão confiante e provocativo quanto sempre. Enquanto isso, a capacidade iraniana de processar urânio continua a crescer e as poucas sanções aplicadas ao país têm efeito irrisório sobre a economia nacional. O Irã não é uma ilha: suas relações com países centro e leste-asiáticos se desenvolvem normalmente. A China, por exemplo, já depende do Irã para 10% de suas importações de petróleo bruto, e, recentemente, assinou com este um acordo multibilionário de participação na exploração do campo petrolífero de Yadavaran. Que os EUA têm desperdiçado muito tempo e energia é óbvio e ululante, com NIE ou sem.
E aqui jaz o pulo do gato: Enquanto afirma que, contra todas as expectativas anteriores, de 2003 a, pelo menos, meados de 2007, o programa nuclear bélico iraniano esteve suspenso, o NIE afirma também – e essa é a parte para a qual devemos atentar – que o Irã “possui a capacidade cientifica, técnica e industrial para, no futuro, produzir armas nucleares se assim decidir”, mas “pode ser mais vulnerável a influência sobre o assunto do que previamente avaliado”. O relatório segue a afirmar que “alguma combinação de ameaças de pressão e escrutínio internacionais intensificados, somadas a oportunidades para que o Irã conquiste segurança, prestigio e objetivos de influencia regional de outras formas, podem – se forem percebidas pelas lideranças iranianas como críveis – fazer com que Teerã prorrogue a suspensão do programa nuclear bélico.” Assim, longe de desvalorizar os esforços americanos contra o Irã, o relatório os toma como causa da suspensão do programa Iraniano, e clama por mais do mesmo.
Estados que abriram mão de seus programas nucleares não são desconhecidos: África do Sul, Líbia e Brasil são apenas alguns exemplos. E certamente há alguma verdade na proposição de que a pressão internacional teve parte em postergar a bomba iraniana. O principal problema com a linha de raciocínio acima, no entanto, é que ela parece ignorar solenemente os efeitos colaterais de uma pressão internacional mal administrada. Antes tivessem sido inúteis, no cômputo geral a pressão e as ameaças ao Irã foram contraproducentes, alimentando o apelo de Ahmadinejad, dando razão a sua busca por resseguro contra intervenção estrangeira (leia-se americana), e o aproximando de outras “vítimas do abuso imperialista”, como Hugo Chavez.
O NIE não deve ser lido, portanto, como um atentado à política externa americana para o Irã, mas como uma tentativa de redenção desta a partir de uma curiosa inversão da História. Não mais um regime terrorista embriagado com petróleo e decidido a espalhar a revolução e o ódio (e tecnologia nuclear) e eliminar do mapa Israel e seu patrono americano, Teerã agora supostamente seria um ator racional “guiado por uma abordagem de custo-benefício”. Sob esta ótica, tudo que os EUA devem fazer é continuar com o excelente trabalho. Boa notícia, não?
Este texto é uma tradução do ensaio entitulado "Can they spin it", ser publicado na Drill Press em março de 2008. Tradução por autor.
© Daniel Nedal 2008
